O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação na Justiça Federal nesta terça-feira, 3, para suspender e anular um contrato milionário de venda de créditos de carbono entre o governo do Pará e um grupo de governos e empresas estrangeiras. O MPF alega que o acordo é ilegal e desrespeita os direitos de comunidades tradicionais.
A principal crítica do MPF é que o contrato é uma “venda antecipada” de créditos de carbono, algo proibido pela lei brasileira que regula esse mercado. Além disso, o Ministério aponta que as comunidades indígenas e tradicionais não foram consultadas de forma prévia, livre e informada antes da negociação e precificação desses créditos.
Em setembro de 2024, o governo do Pará anunciou o acordo, estimando um valor de quase R$ 1 bilhão em créditos de carbono. O contrato foi firmado entre a CAAPP, representando o estado, e a organização coordenadora da coalizão estrangeira LEAF (Lowering Emissions by Accelerating Forest Finance).
A ação foi aberta contra a União, o estado do Pará e a Companhia de Ativos Ambientais e Participações do Pará (Caapp).
O MPF fez outros pedidos à Justiça:
- Bloqueio de Pagamentos: O estado do Pará não deve receber dinheiro do mercado de carbono até que seu sistema de venda de créditos seja aprovado e esteja de acordo com a lei.
- Restrição à Certificação Internacional: A União deve ser impedida de autorizar o Pará a negociar diretamente com certificadoras internacionais, pelo mesmo motivo.
- Indenização de R$ 200 Milhões: O MPF pede que o estado do Pará pague R$ 200 milhões por danos morais à sociedade. Esse valor é cobrado por ter vendido antecipadamente recursos ambientais de territórios de povos tradicionais sem a consulta obrigatória. A indenização também considera uma cláusula do contrato que previa o reembolso da garantia de venda para a empresa coordenadora da coalizão internacional em caso de reclamações contra o acordo.
Pressão antes da COP30
O MPF alerta que o governo do Pará estaria correndo para aprovar seu sistema de mercado de carbono antes da COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), que acontecerá em Belém. Essa pressa estaria gerando pressão sobre povos indígenas e comunidades tradicionais.
Mesmo com o estado tentando um diálogo com as comunidades, o MPF aponta que a maioria delas não compreende a proposta ou o mecanismo do mercado de carbono, o que torna a consulta inadequada.
Por isso, o MPF pediu uma decisão urgente da Justiça, argumentando que a continuidade do contrato e o processo de consulta apressado causam prejuízos concretos às comunidades, como divisões internas e desrespeito à sua autonomia.
Conciliação negada
Nesta terça-feira, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) tentou uma conciliação sobre o caso. No entanto, o MPF negou a conciliação, explicando que sua atuação é para defender a lei e os direitos socioambientais das comunidades tradicionais.
O MPF também se baseia em um guia interno sobre o mercado de carbono e suas implicações para povos indígenas e comunidades tradicionais. O documento detalha fraudes e problemas históricos nesse mercado, reforça a importância da consulta prévia e da proteção territorial, e orienta o MP a investigar contratos que envolvam essas populações, especialmente em casos de “grilagem de carbono” ou falta de transparência.
O guia destaca que a intervenção do MPF deve ser “com a máxima antecedência possível” para proteger o modo de vida tradicional dessas comunidades.
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